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Marrowbone: uma narrativa dúbia


(Divulgação)
       
Dirigido pelo roteirista Sergio G. Sánchez, O Segredo de Marrowbone (do inglês, “Marrowbone”, apenas) conta a história de uma família de quatro irmãos que, sofrendo a perda da mãe, muda-se para um local ermo na tentativa de se manterem unidos, deparando-se, no processo, com um nefasto e sombrio segredo. Não conhecia todo o elenco, mas cito aqui, especificamente, a atriz Anya Taylor-Joy (A Bruxa, 2015; Fragmentado, 2016), para aqueles que já são mais familiarizados com o universo dos thrillers.
Essa premissa simples esconde um entretenimento de ótima qualidade. Em essência, um dos pontos que mais me encantou foi, além da atmosfera instigante, a forma como a narrativa é conduzida. Embebida de mistério, drama e suspense, a trama é lentamente tecida, com cada retalho sendo colocado em cena para desembocar em um final muito bem confeccionado. Utiliza-se, para isso, uma construção calcada na subjetividade e em cima de diversos questionamentos e dúvidas.
Essas incertezas, inclusive, são a força motriz por trás de tudo e, justamente por contar com um roteiro bem acertado e intrigante, não houve espaço para que desandasse. A trama é deliberadamente tendenciosa, o que não é uma característica ruim; pelo contrário, apenas consolida a precisão do roteiro. Afinal, como todo bom suspense que se preze, há a entrega de fragmentos de informação, meias verdades e omissões que propositalmente criam uma narrativa tendenciosa e elusiva, feita para pegar o telespectador desprevenido.
Nesse contexto, cabe citar que, notavelmente, não é um filme de todo criativo  e é realmente é difícil encontrar completa autenticidade num mundo com tantas obras e produtos diversos. O final, que pode ser um baque chocante para várias pessoas, se edifica, na realidade, a partir de um artifício muito recorrente em outros filmes e até mesmo em livros. Isso abre a possibilidade para fãs mais entusiastas matarem a charada muito antes do final ao prestar atenção nos detalhes distribuídos. Ainda assim, tal recurso é muito bem utilizado, pois o esmero narrativo consolida a devida coesão entre as informações primárias até o zênite derradeiro  o imenso plot twist. Nada ali é por acaso e, juntos, os elementos dispersos se alinhavam magistralmente ao final.      
Aproveitando esse gancho, preciso dizer que a grande dúvida que o título sugere é o fio condutor da trama. Muito embora você passe o filme inteiro tentando descobrir o que eles escondem, você percebe que as coisas podem ser um pouco mais complexas e intrincadas, abrilhantando ainda mais a composição. Enquanto você se questiona sobre o que está acontecendo, as pistas vão sendo lançadas e, quando devidamente encaixadas, a sensação de tapa na cara é surpreendentemente revigorante. Essa seção deve ser bastante reiterada, pois sinto que é um dos pilares mais importantes do longa.
 
(Divulgação)
                             
Decerto, como deve ter percebido, o preciosismo na constituição da história, que também acometeu Dark por exemplo, pode soar cansativo e maçante em alguns momentos, mas acredito que, até lá, já haverá imersão o suficiente para isso não ser um problema. Afinal, esse capricho é primordial para a conexão e progressão da trama, que nos faz entender as nuances de cada um dos irmãos simultaneamente com a simbologia do plot principal. Os signos estão espalhados por todo o filme e permeia-o com acuidade e sagacidade. Soma-se a isso, também, uma ótima produção: fotografia, figurino e atuações confortáveis, que trazem mais verossimilhança e intensidade. Temos, assim, um casamento de elementos bastante harmônicos.
Finalmente, afastando-se desses apelos técnicos, falando como telespectador, o filme consegue abarcar o melhor dos dois mundos: não é entediante como muitos filmes cults,  mas também não é raso como muitos terrores genéricos. Ele está na medida certa: distancia-se tanto da pretensão da academia quanto do vazio textual dos longas enlatados. Portanto, temos aqui um equilíbrio entre história, jump scare, um ótimo suspense, ótimas personagens, grandes viradas e alguns clichês de praxe. 
Importa ressaltar, ainda, que O Segredo de Marrowbone não foi exatamente um blockbuster e eu não sei bem explicar o porquê. Queria poder dizer que é porque foge dos terrores convencionais, mas não acho que seja a justificativa, uma vez que mesmo Hereditário (2018) e A Bruxa (2015), considerados o pós-terror, tiveram uma repercussão bem grande para o parâmetro do gênero  praticamente o novo mainstream do terror. Assim, a baixa popularidade não necessariamente reflete a qualidade do longa. Por isso, fica aqui a indicação: um filme que é um ótimo prato para aqueles que gostam de um roteiro instigante e uma boa história.


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